terça-feira, 16 de setembro de 2008

108 € por cada minuto detido


Ministério Público vai recorrer de indemnização atribuída por detenção ilegal no Apito Dourado

NUNO MIGUEL MAIA


O Tribunal da Relação do Porto deu razão ao dirigente do F. C. Porto na acção cível contra o Estado por alegada detenção ilegal. Atribuiu-lhe 20 mil euros de indemnizão e juros. Mas o Ministério Público vai recorrer.

Alberto Pinto Nogueira, procurador-geral distrital do Porto, confirmou ao JN que o Ministério Público não se conforma com esta decisão no caso de Pinto da Costa e já ordenou a interposição de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

No Tribunal de Gondomar, em primeira instância, o Estado tinha sido absolvido pelo juiz que também julgou e condenou os arguidos do processo Apito Dourado. António Carneiro da Silva concluiu que, com uma detenção por três horas e cinco minutos sofrida a 2 de Dezembro de 2004, quando - após a PJ não o ter o encontrado numa busca a sua casa - se apresentou voluntariamente no tribunal para ser interrogado, o dirigente não sofreu "prejuízos anómalos e de particular gravidade".

Isto porque, na argumentação do juiz, uma coisa é uma detenção e outra completamente diferente é a sujeição a prisão preventiva. Só a prisão preventiva injustificada tem "potencial lesivo" que justifique uma indemnização. E Pinto da Costa "foi detido, não preso", acentuou o juiz. Que considerou a detenção legal, mesmo tendo ocorrido nas instalações do tribunal. Só seria ilegal se se tivesse excedido o prazo de 48 horas de apresentação a juiz, se se mantivesse fora dos locais legalmente permitidos, se fosse ordenada por entidade sem poderes para tal, ou motivada por facto que a lei não permite.

Gil Moreira dos Santos, advogado do presidente do F. C. Porto, não concordou com este desfecho e recorreu para a Relação do Porto, insistindo numa indemnização de 50 mil euros. Argumentou que a lei não diz que o prazo de detenção é relevante para ser considerada ilegal, nem para se ser indemnizado é necessário ter sofrido um dano especial e anómalo.

Sublinhou ainda que, em rebate da ironia do juiz - que na sua decisão utilizou várias vezes a expressão "curiosamente, ou talvez não" - estar detido durante três horas e cinco minutos após uma apresentação voluntária, e mesmo que se reconheça não existir perigo de fuga, não é o mesmo que "assistir ao choro de uma criança que chora porque... tem de chorar". E carregou no argumento de que, para serem aplicadas medidas de coacção, não era obrigatório o arguido estar sob detenção.

Assim, na argumentação daquele advogado, a ilicitude da actuação do Estado consumou-se com a detenção considerada, naquele momento, desnecessária e desproporcional, não sendo relevante a sua duração.

Os juízes da 3.ª secção cível da Relação deram-lhe agora razão e condenaram o Estado a indemnizar Pinto da Costa em 20 mil euros. Fazendo as contas, o dirigente irá receber cerca de 108 euros por cada minuto que esteve detido, já que o tempo total ascende a três horas e cinco minutos. Um montante ao qual, sabe o JN, acrescem juros de mora contados a partir de Dezembro de 2005, data em que entrou a acção no Tribunal de Gondomar.

Todavia, a decisão não é definitiva, uma vez que o Supremo Tribunal de Justiça ainda poderá alterar a decisão, na sequência do recurso do Ministério Público que deverá ser subscrito pelo procurador-geral adjunto, João Ferreira Pinto.

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